Estava um dia ensolarado como poucos naquele frio inverno. O sol, morninho, convidava ao passeio, naquela tarde de sábado.
Pegou nas chaves do carro, decidida a desfrutar daquela luz invulgar. A praia, ali tão perto, era o destino ideal.
Lá seguiu, não sem antes se debater com o trânsito infernal da cidade. Parecia impossível, um sábado tão movimentado! Era Natal, lembrou-se, e o consumismo desenfreado estava a fazer das suas.
Ainda não tinha comprado nada para os sobrinhos... nem para a restante família... em boa verdade, nem para os amigos mais chegados... mas isso não importava. Nada. Naquele dia, só mesmo aquela luz mágica a levaria a sair do aconchego do sofá e das ternuras da sua gata, que reclamou quando percebeu que iria ficar sózinha.
Chegada ao destino, espreguiçou-se.
Hum!!! O sol, morninho naquela tarde de Dezembro, a bater-lhe nas costas...
Descalçou as botas (altas, porque até uma ida à praia merecia que estivesse no seu melhor), e caminhou em direcção ao mar.
Uma onda veio morrer no areal e molhou-lhe os pés descalços. Um arrepio percorreu-lhe a espinha, mas não se importou. O sol, morninho naquela tarde de Dezembro, havia de os secar.
Olhou em volta. A praia estava deserta, como a sua alma, naquela tarde de sol morninho de Dezembro.
Sentou-se, bem no meio do areal, que apresentava sulcos, testemunhas da fúria marítima.
Aquela tarde, de sol morninho de Dezembro, não era uma tarde qualquer.
Fazia precisamente um ano que o tinha deixado partir, carregando malas. E mágoas.
A despedida não tinha sido fácil, temperada com muitas lágrimas e promessas de que voltaria.
Volvido precisamente um ano, naquela tarde de sol morninho de Dezembro, já não sabia se queria que voltasse. Afinal, o que é que os tinha feito ficar juntos?
A ela, interessava-lhe a arte, o ar livre, o sorriso das crianças...
Ele, perdia-se no mundo virtual e, aos poucos, perdia-a a ela, apercebia-se agora.
Espreguiçou-se, uma vez mais, naquela tarde de sol morninho de Dezembro.
Levantou-se, decidida a sacudir a areia que se lhe tinha entranhado no corpo.
Calçou-se, e reparou que o sol já se punha. Entrou no carro, decidida a deixar-se levar pela compulsão consumista. Era hora de mudar. Começaria por se dirigir ao centro comercial mais próximo, com o pensamento nos jogos que iria comprar para os sobrinhos. Para si, decidiu dar-se uma prenda, mais profunda. Mal chegasse a casa, entraria no mundo virtual, dele, e dir-lhe-ía que também ela queria celebrar um nascimento: o da sua alma.
. O quarto azul do mar da i...
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